domingo, 31 de agosto de 2008

Do compartilhar

Se existe algum tipo de mágica nesse mundo, deve estar na tentativa de entender alguém, de compartilhar alguma coisa. Eu sei, é quase impossível conseguir, mas... quem se importa? A resposta deve estar na tentativa.

sábado, 30 de agosto de 2008

Das recordações

Hj teve mais um encontrão semestral das minhas amigas do colégio. Evento sempre cheio de comidas e lembranças. Dessa vez uma das amigas fez um vídeo, daqueles bem barangos mesmo, com fotos nossas daquela época. Morremos de rir com o quanto mudamos fisicamente, na maioria das vezes pra melhor (que bom!) e com fatos e viagens nossas de década atrás. Relembramos histórias, agendas, cadernos de conversa, paqueras, códigos e musiquinhas...
Porque algumas coisas por mais que fiquem algum tempo em latência, conseguem voltar à tona e serem tão boas quanto antes.

quarta-feira, 27 de agosto de 2008

...

As necessidades recônditas do nosso ser são as que nos dirigem silenciosamente.



[Herman Melville]

terça-feira, 26 de agosto de 2008

The flowers


In the hope of reaching the moon
Men fail to see the flowers
That blossom at their feet.

[Albert Schweitzer]

segunda-feira, 25 de agosto de 2008

domingo, 24 de agosto de 2008

Liberdade

Indescritível.









Das felicitações

Alguém me explica de onde surgiu o mal hábito de explicitarmos às pessoas nossos votos de felicidades e o quanto gostamos delas apenas na data comemorativa do aniversário delas?

quarta-feira, 20 de agosto de 2008

Da justiça

mas o que exatamente nesse mundo se confiigura como justo ou injusto?

terça-feira, 19 de agosto de 2008

Leaving

Leaving.
Living.

segunda-feira, 18 de agosto de 2008

O outro (in simple past)

"O outro. A invasão do outro. A gentil crueldade do outro.
A saudade do outro. O silêncio do outro.
A respiração do outro. com outra.
A voz do outro. com outra.
Cada qual em uma ponta da cidade. O trânsito, a chuva, o calor, o sono, o cansaço. O medo, não. O medo não diziam. Deixavam-se recados truncados pelas máquinas, ao reconhecer a voz um do outro atendiam súbitos em pleno bip ou deixavam o telefone tocar e tocar sem atender.

Sim, afligia muito querer e não ter. Ou não querer e ter. Ou não querer e não ter. Ou querer e ter. Ou qualquer outra enfim dessas combinações entre os quereres e os teres de cada um, afligia tanto."



[Caio Fernando de Abreu - modificado]

I desideri

"Non è che la vita vada come tu te la immagini. Fa la sua strada.

E tu la tua. Io non è che volevo essere felice, questo no. Volevo... salvarmi, ecco: salvarmi. Ma ho capito tardi da che parte bisognava andare: dalla parte dei desideri. Uno si aspetta che siano altre cose a salvare la gente: il dovere, l'onestà, essere buoni, essere giusti. No. Sono i desideri che salvano. Sono l'unica cosa vera. Tu stai con loro, e ti salverai. Però troppo tardi l'ho capito. Se le dai tempo, alla vita, lei si rigira in un modo strano, inesorabile: e tu ti accorgi che a quel punto non puoi desiderare qualcosa senza farti del male. E' lì che salta tutto, non c'è verso di scappare, più ti agiti più si ingarbuglia la rete, più ti ribelli più ti ferisci. Non se ne esce. Quando era troppo tardi, io ho iniziato a desiderare. Con tutta la forza che avevo. Mi sono fatta tanto di quel male che tu non puoi nemmeno immaginare"


[Alessandro Baricco]

Do inesperado

por mais que você esteja se esforçando, ainda não é o suficiente.

vem a vida, o destino, o carma, enfim, o nome que você preferir e chuá, joga um balde de água fria na sua frente.

você disfarça, continua conversando, finge que não viu.

tarde demais. ao seu lado... direito.
(ainda bem que é esse. se fosse outro, talvez fosse pior...) *

como forma da vida te provar. te cutucar. te aguçar.

justo em um primeiro dia de mudança de padrão mental.

e você percebe que ainda não está livre.

que ainda falta.

que a ausência incomoda.

mas que a sorridente presença incomoda ainda mais.

e que estava sim, sentindo falta daquele olhar ainda que sutilmente direcionado ao seu decote, de forma quase imperceptível.
mas quem já esteve habituada à voracidade desse olhar, sabe facilmente reconhecê-lo.

e também aquele leve nervosismo disfarçado num cruzar de braços bem típico. e que ironia a companhia do amigo, justo aquele que em outros tempos tentou ser empurrado à você, o quase cupido. e você nesses tempos, de certa forma também cupida, posteriormente culpada, que assinava mensagens como "a melhor amiga".

a vida muitas vezes chega a ser absolutamente sarcástica...

e você igualmente sorri, ao constatar tudo isso.

isso (porque isTo é do outro): sequência de fatos vindo em intervalos muito pequenos de tempo, enquanto você disfarça os pensamentos e conversa sobre banalidades.
aliás, eis sua forma de disfarçar o nervosismo: você fala. fala. fala. não sabe nem sobre o que, mas normalmente banalidades impensadas e corriqueiras.
no fim, leve abraço você sentada, ele em pé, que nem de perto lembra os de outros tempos, e deixa sua mensagem, ainda que sob poucas palavras, quase despercebidas.
"saudade. some não, hein."

e ao vê-lo dar as costas, você percebe que vai ter que se esforçar um pouco mais.

pra que o controle volte a ser novamente seu.
conquistado rapidamente, mas carente de esforço.

pra que sua mente alcance novamente o estado livre do instante anterior. (alcançado pelo, com e devido ao outro)

e especialmente, pra que esse sorriso deixado no seu rosto venha a ter um outro significado...

* parênteses : explicações/pensamentos referidos ao outro.

[atualizacao em 04/02/09... como a vida dá voltas meu deus! uou!]

o umbigo do mundo

É horrível perceber o quanto as pessoas olham apenas para seu próprio umbigo. Dia a dia me surgem situações que mostram isso: o descaso pelos outros, a ausência de qualquer interesse pelo que o outro pensa, a falta de consideração com as vontades e necessidades das pessoas em volta. Vá la que existem milhares de defeitos possíveis de se perceber em uma pessoa e que podem incomodar horrores, mas convenhamos que há poucas coisas que atrapalhem tanto na convivência em grupo quanto gente egoísta...

um pouco (ou nada) de quem sou

Nomes... nomes são coisas complicadas. As vezes dizem muito, as vezes nada; as vezes pesam; as vezes incomodam... Como escolher um nome para outra pessoa? O nome dado a uma criança carrega uma serie de esperanças, expectativas... E um nome pra si mesmo? Não requer isso uma senhora dose de auto conhecimento? Ou então outro tanto de expectativa de mudança? Ou daquela historia do que você gostaria de ser mas não é? Ou do que as pessoas pensam que você seria?

Tem dias em que paro e penso que se conhecer é algo um tanto o quanto difícil. Acho que me faltam milhares de horas de pensação eu a sós comigo pra me encontrar, me entender, saber o que esperar...

Volta e meia alguém comenta sobre como deveria haver manuais de instruções para as pessoas: para aquele homem incoerente, para o namorado inconstante, para os pais, para o paciente complicado... Mas existe algo que precise mais de manual do que a gente mesmo? Quem não queria saber o que faz pra fazer passar aquela angustia sem sentido que não se sabe de onde vem? Ou pra controlar aquele ciúme que a própria razão diz que é sem sentido mas que parece incontrolável?
Ou será que sou só eu que as vezes tenho a impressão de que não sei do que gosto realmente, que não sei porque estou fazendo determinada coisa, que não entendo minhas reações a certos fatos, que me condeno por não saber meus próprios limites...? Será que sou só eu que as vezes tenho a impressão de que não sei realmente quem sou? Será que sou só eu que tenho a impressão de que me prendo ao "o que os outros pensam que eu seja" por nao saber por mim mesma?

sábado, 16 de agosto de 2008

Too much of anything

It's time of changes.
"None but ourselves can free our minds."

sexta-feira, 15 de agosto de 2008

Dos postulados

Nossa, hoje eu tinha tanta coisa pra falar... de alguns vários pacientes legais, do engarrafamento que me deixou uma hora e meia em pé dentro do ônibus pra chegar em casa do serviço, do compartilhar, da amizade verdadeira, do pensar excessivo, das diretas indiretas... mas vou deixar (momentaneamente) todas essas coisinhas de lado para falar um pouquinho da lei da vida...
Acabei de ler um texto a esse respeito, o qual sintetizo em 4 "postulados":

1. Devíamos sempre agradecer pelas nossas dificuldades, pois através delas obtemos o melhor: aprendizado.

2. Quanto mais conseguirmos tolerar os contratempos do mundo, mais empelidos no caminho da evolução estaremos.

3. Quanto mais liberdade for concedida aos que amamos, para que vivam a existência que escolherem, mais livres estaremos para construir a nossa própria felicidade.

4. Quanto mais compreender aqueles que compartilham a vida ao seu lado, assim como quanto mais doar de si em benefício alheio, mais tranquilidade terá em seus passos.

E acredito que se conseguirmos seguir sinceramente uma vírgula da mensagem contida nessas poucas linhas, estaremos no caminho certo.
E é o que me proponho a fazer.

Da brincadeira

...quem brincava de princesa acostumou-se à fantasia.

quarta-feira, 13 de agosto de 2008

Verdade...

"Men always want to be a woman's first love. That is their clumsy vanity. We women have a more subtle instinct about things. What we like is to be a man's last romance."

[Oscar Wilde]

Do achar

Lembram que há alguns dias eu tinha perdido uma coisa e estava chateada? Pois bem, achei a coisa! E estava tão embaixo do meu nariz, que se fosse uma cobra tinha me mordido...
Mas vim aqui pra contar do quão bom é achar uma coisa que se estava procurando!
As vezes até vale a pena perder algo, só pra ter o prazer de se achar novamente...(bom, só beeeeeeem as vezes...)

terça-feira, 12 de agosto de 2008

O eu


Porque eu, tudo que sou e onde eu estou, sou mero fruto de uma sucessão de planos frustrados.

segunda-feira, 11 de agosto de 2008

Dos pacientes II

Pensem comigo, quão anti-ético seria aceitar o convite pra sair de um paciente?

Um paciente gato, muito gato: morenasso, olhos verdes, ectoscopia impecável, tórax simétrico e bem definido, abdome plano e sarado (ai, ai...) me perguntou se um anel de ouro que uso na mão direita era de noivado. Eu respondi que não, que nem tava namorando. (Também não precisava ter dado detalhes, né?) Aí ele me perguntou se me chamasse pra sair se eu aceitaria.

Rá!
Me achei!

Solteira, livre e desimpedida que sou, bem que poderia ter aceitado. Mas considerei a situação minimamente, pra não dizer absolutamente, contra a ética da profissão e não aceitei.
Tá bom vai, sei que ainda sou das únicas mongolóides que levam esse tipo de princípio à sério, mas... thats me.
Meu nome é princípio, prazer.

(Mas que não deixo de me remoer, ai isso não...)

domingo, 10 de agosto de 2008

Do desejo

"É horrível na vida da gente ficar sem alguma coisa que nós queremos; mas caramba, o que me enfurece é não poder dar a alguém alguma coisa que a gente queria que ele tivesse."

[Truman Capote]

sexta-feira, 8 de agosto de 2008

Da dor

Dor. Dolor. Dolore. Douleur. Schmerz. Pijn. Pain.

Pela dor que os pacientes chegam clamando diariamente.
Pela dor da alma, a mais difícil de ser curada e cuja a cura é a mais desejada.
Pela dor epigástrica mais do que insuportável que estou sentindo e que nem Mylanta, nem pantoprazol, nem um potão de açaí, nem a minha atual posição fetal estão conseguindo dar um jeito.

(Se a causa dessa maldita for uma úlcera e eu morrer de peritonite, volto pra puxar o pé de todo mundo à noite!)

quinta-feira, 7 de agosto de 2008

Da perda

Existe coisa mais chateante do que perder uma coisa e não ter a menor idéia de aonde aquilo foi parar?

quarta-feira, 6 de agosto de 2008

Da confiança

Era uma vez uma pessoa que confiava em outra, e pra ela contava tudo. Eis que um dia a primeira descobre que a segunda traiu a sua confiança, em algo que esta ingênua primeira temia. Aí acabou. A amizade. A confiança. O amor. E cada um foi viver em um canto, confiando e tendo sua confiança traída por outras pessoas.
FIM.
(não, ninguém viveu feliz pra sempre, porque isso não existe. Além disso, se não há confiança, já era...)

Da paranóia

Porque a paranóia chegou e parou.
E ninguém, repito, ninguém consegue tirar a pobre daqui de dentro do porão... A mania de perseguição chegou junto pra tentar tirar a coitada, mas não teve sucesso e acabou ficando presa aqui dentro também.

(Alguém me aplica umas 15 ampolas de amplictil EV em Bolus agora! não, haldol é melhor...)

Dos transportes

Hoje fiz o meu segundo exame médico e psicotécnico pra tirar carteira. Calma, AINDA não tomei pau em um psicotécnico. Supostamente minha sanidade mental não está comprometida. O lance é que sou uma pessoa bem enrolada. Sabe aquele tipo que começa a fazer um monte de coisa e costuma deixar quase tudo incompleto, pelas metades? Pois é, sou eu. E seguindo esse padrão iniciei meu processo de habilitação em 2002 e ainda não foi concluído. (Sim, 6 anos!) . Como prescreveu o prazo de 5 anos, cá estou iniciando tudo de novo.

Você deve estar se perguntando como um ser humano sobrevive 25 anos sem ser habilitado à dirigir. É que como morei sempre perto do colégio, da faculdade, e no caminho de quem está indo ou voltando de algum lugar, sempre arrumava uma caroninha ou andava a pé mesmo. Pois bem, eis que no meio disso tudo, o que acontece? Acaba a faculdade! Formei e fui jogada na rua da amargura. Mas isso é tema pra outros e longuíssimos textos...

O problema é que com isso, comecei a trabalhar em lugar muito, mas muito longe da minha casa, e tive que começar a aprender a usar um famoso meio de transporte coletivo, o ônibus. (Busú ou busão, para os íntimos).

Se antes eu acordava 20 minutos antes da aula, passei a ter que enfrentar a dura tarefa de acordar 1 hora e meia antes do serviço! Isso gastando os mesmos 20 minutos pra me arrumar, 10 minutos pra chegar ao ponto e cerca de 1 hora dentro do maledito...

No início achava um suplício, um inferno, e com o perdão da palavra, uma merda. Mas passei a ver o lado bom das coisas e apesar de ainda ver o lado ruim, consigo até me divertir... Hoje fui até cantada dentro do ônibus. Um ser humano me vira pra mim e solta a seguinte frase: "Nó, apaixonei." O que será que se passa na cabeça desse alguém? Será que ele imaginou que eu ía virar e dizer :"ai, eu também. vamos fazer filhos?" Ou será que ele achou que eu ía agradecer e puxar papo? Coisa mais sem propósito. Aliás falando em puxar papo, o ser que estava sentado ao meu lado passou cerca de 40 minutos olhando os mesmos 2 únicos albinhos de fotos, daqueles pequenos da retes. Deve ter visto cada um no mínimo 5 vezes, e nessa de ver fotos, jogando/roçando o braço pra cima de moi. Eu que odeio esse tipo de coisa, fui arredando pra beirada, até um momento em que quase caindo do banco resolvo quase dar as costas pro coitado. Acho que a intenção dele devia ser que eu visse as fotos, sei lá, ou só queria ficar relando mesmo. Mas eis que me começa a puxar assunto, tipo: "nossa, foto é bom que a gente guarda o momento do jeito que é, né?" No que eu, com ódio daquela intimidade forçada, respondo um monossilábico: "é..."
Pra completar minha diversão eis que entra no ônibus um daqueles moços que vendem bala dentro dos coletivos. Não estou criticando, de forma alguma. É o jeito do cara ganhar o dele. Mas esse resolveu inovar. Ao invés do famoso discursinho eu-nao-vim-aqui-para-roubar, ele me vem com um monte de papeizinhos com uma poesia sobre a vida. Era algo tipo falando que devemos aproveitar as oportunidades e as dificuldades da vida. E no fim oferecendo humildemente duas balas por um real. Achei interessante essa abordagem poética...
Mas enfim, cansei de escrever. Estórias das minhas andanças pelos ônibus é que não vão faltar, mas por hoje chega.

terça-feira, 5 de agosto de 2008

Dos pacientes

Quando está pagando a consulta, o paciente quer e tem o direito de se queixar da ponta do fio de cabelo que está fraca até o dedinho do pé esquerdo que está formigando. Isso passando pela dor que sobe e desce, pela fincada na garganta, pelo problema do ranço com carne de porco e ainda a maldita ursa na boca do estrombo...

Já quando estão sendo examinados por alguma outra razão, especialmente exames periódicos do trabalho em que a "consulta" anual é paga pela empresa, tudo some. Tá todo mundo ótimo. Aliás, ótimo não, normal.
Normal.
Essa é a resposta de 99,6% dos pacientes.

- Tá sentindo alguma coisa hoje, senhor Guiomar?

- Não, normal.

A situação vivenciada repetidamente além de a primeira vista me divertir, me fez questionar o que leva alguém a responder "normal" à pergunta acima...
Talvez o medo de dizer a verdade e ser despedido:

- sim doutora, tô sentindo uma dor na coluna insuportável!

Talvez a ausência de outras verdades pela falta de confiança e intimidade obviamente impossibilitada, pra não dizer destruída, em uma relação médico-paciente de 5 minutos:

- sim doutora, tô sentindo muita falta do meu namorado que me trocou por outra.

ou quem sabe:

- sim doutora, minha vida tá péssima e tô sentindo uma tremenda vontade de morrer, já até comprei a corda!

É, acho que "normal" = "estou me sentindo como de costume". Mas não necessariamente esse costume significa não estou sentindo nada. No fundo eles estão é querendo transmitir uma ausência de sentimentos/sensações diferentes dos habituais.



Ainda hoje, no mesmo exame periódico de 5 minutos, em que mal se trocam palavras, e foram ouvidos muitos "normal" como resposta, uma paciente de 42 anos me causou admiração, exatamente por sua resposta fugir do normal.

- Bom dia, Dona H. , a senhora está se sentindo bem?

- Estou incrivelmente bem, doutora. Graças a Deus.

- Que bom, Dona H.! Fico feliz pela senhora.

Tal resposta me surpreendeu.

Me perguntei e logo perguntei a ela a razão de tanto bem estar, no que ela me contou que realizou uma colecistectomia videolaparoscópica (cirurgia de retirada da vesícula), e no fim da operação, o cirurgião ao realizar uma vistoria na cavidade abdominal antes de fechar, visualizou uma massa no ovário esquerdo. Na mesma cirurgia o ovário foi retirado e biopsiado, e o resultado foi um câncer de ovário. Posteriormente o útero foi retirado, mas felizmente não foram encontradas metástases. Mas para evitar que ainda estejam circulando células malignas que posteriormente podem se implantar e crescer em algum outro lugar, ela está passando por sessões de quimioterapia. Essas por sua vez à fizeram engordar, perder os cabelos e a vaidade. Mas não fizeram Dona H. perder a esperança e a alegria por estar viva. Por ter encontrado o tumor antes de ser tarde demais, antes de ser possível fazer alguma coisa. Com sua descabelada peruca levemente ruiva, Dona H. me passou a lição de que devemos ver o lado bom de todas as coisas, e não apenas levar uma vida normal, com respostas normais.


E se ao reler vejo que possivelmente não fez o menor sentido nada do que escrevi, azar. Isso aqui é instrumento de catarse. E não pra fazer lógica pra alguem. E tenho dito.

Confissão

Acabo de perceber que o que seria um espaço de desabafo, na verdade não se tornou bem isso... Não tô conseguindo colocar em palavras o que estou sentindo, e acabo transcrevendo textos em que um trecho ou outro demonstram isso... Pra mim isso é o cúmulo da dificuldade em se expressar.
Beleza, acabo de perceber que cá vou eu morrer trancafiada dentro de mim mesma. E quem sabe daqui a milênios, milênios no ar, os escafandristas ou os sábios conseguirão me decifrar...

sábado, 2 de agosto de 2008

Carrego Comigo

Carrego comigo
há dezenas de anos
há centenas de anos
o pequeno embrulho

Serão duas cartas?
será uma flor?
será um retrato?
um lenço talvez?

Já não me recordo
onde o encontrei.
Se foi um presente
ou se foi furtado

Se os anjos desceram
tranzendo-os nas mãos
se boiava no rio.
se pairava no ar.

Não ouso entrabri-lo
Que coisa contém,
ou se algo contém,
nunca saberei.

Como poderia
tentar esse gesto?
O embrulho é tão frio
e também tão quente.

Ele arde nas mãos,
é doce ao meu tato.
Pronto me fascina
e me deixa triste.

Guardar um segredo
em si e consigo,
não querer sabê-lo
ou querer demais.

Guardar um segredo
e seus próprios olhos,
por baixo do sono,
atrás da lembrança.

A boca experiente
saúda os amigos.
Mão aperta mão,
peito se dilata.

Vem do mar o apelo,
vêm das coisas gritos.
O mundo te chamas
Carlos! Não respondes?

Quero responder.
A rua infinita
vai além do mar.
Quero caminhar.

Mas o embrulho pesa.
Vem a tentação
de jogá-lo ao fundo
da primeira vala.

Ou talvez queimá-lo:
cinzas de dispersa
me não fica sombra
sequer, tem remorso.

Ai, fardo sutil!
que antes me carregas
do que és carregado,
para onde me levas?

Por que não me dizes
a palavra dura
oculta em teu seio,
carga intolerável?

Seguir-te submisso
por tanto caminho
sem saber de ti
senão que te sigo.

Se agora te abrisses
e te revelasses
mesmo em forma de erro,
que alívio seria!

Mas ficas fechado.
Carrego-te à noite
se vou para o baile.
De manhã te levo

para a escura fábrica
de negro subúrbio.
És, de fato, amigo
secreto e evidente.

Perder-te seria
perder-me a mim próprio.
Sou um homem livre
mas levo uma coisa.

Não sei o que seja.
Eu não a escolhi.
Jamais a fitei.
Mas levo uma coisa.

Não estou vazio,
não estou sozinho,
pois anda comigo
algo indescritível.

[Carlos Drummond de Andrade]

sexta-feira, 1 de agosto de 2008

Sem Ana, blues

Quando Ana me deixou - essa frase ficou na minha cabeça, de dois jeitos - e depois que Ana me deixou. Sei que não é exatamente uma frase, só um começo de frase, mas foi o que ficou na minha cabeça. Eu pensava assim: quando Ana me deixou - e essa não-continuação era a única espécie de não continuação que vinha. Entre aquele quando e aquele depois, não havia nada mais na minha cabeça nem na minha vida além do espaço em branco deixado pela ausência de Ana, embora eu pudesse preenchê-lo - esse espaço branco sem Ana - de muitas formas, tantas quantas quisesse, com palavras ou ações. Ou não-palavras e não-ações, porque o silêncio e a imobilidade foram dois dos jeitos menos dolorosos que encontrei, naquele tempo, para ocupar meus dias, meu apartamento, minha cama, meus passeios, meus jantares, meus pensamentos, minhas trepadas e todas essas outras coisas que formam uma vida com ou sem alguém como Ana dentro dela. Quando Ana me deixou, eu fiquei muito tempo parado na sala do apartamento, cerca de oito horas da noite, com o bilhete dela nas mãos. No horário de verão, pela janela aberta da sala, à luz das oito horas da noite podiam-se ainda ver uns restos dourados e vermelho deixados pelo sol atrás dos edifícios, nos lados de Pinheiros. Eu fiquei muito tempo parado no meio da sala do apartamento, o último bilhete de Ana nas mãos, olhando pela janela os dourados e o vermelho do céu. E lembro que pensei agora o telefone vai tocar, e o telefone não tocou, e depois de algum tempo em que o telefone não tocou, e podia ser Lucinha da agência ou Paulo do cineclube ou Nelson de Paris ou minha mãe do Sul, convidando para jantar, para cheirar pó, para ver Nastassia Kinski nua, pergunrando que tempo fazia ou qualquer coisa assim, então pensei agora a campainha vai tocar. Podia ser o porteiro entregando alguma dessas criancinhas meio monstros de edifício, que adoram apertar as campainhas alheias, depois sair correndo. Ou simples engano, podia ser. Mas a campainha também não tocou, e eu continuei por muito tempo sem salvação parado ali no centro da sala que começava a ficar azulada pela noite, feito o interior de um aquário, o bilhete de Ana nas mãos, sem fazer absolutamente nada além de respirar. Depois que Ana me deixou - não naquele momento exato em que estou ali parado, porque aquele momento exato é o momento-quando, não o momento-depois, e no momento-quando não acontece nada dentro dele, somente a ausência da Ana, igual a uma bolha de sabão redonda, luminosa, suspensa no ar, bem no centro da sala do apartamento, e dentro dessa bolha é que estou parado também, suspenso também, mas não luminoso, ao contrário, opaco, fosco, sem brilho e ainda vestido com um dos ternos que uso para trabalhar, apenas o nó da gravata levemente afrouxado, porque é começo de verão e o suor que escorre pelo meu corpo começa a molhar as mãos e a dissolver a tinta das letras no bilhete de Ana - depois que Ana me deixou, como ia dizendo, dei para beber, como é de praxe. De todos aqueles dias seguintes, só guardei três gostos na boca - de vodca, de lágrima e de café. O de vodca, sem água nem limão ou suco de laranja, vodca pura, transparente, meio viscosa, durante as noites em que chegava em casa e, sem Ana, sentava no sofá para beber no último copo de cristal que sobrara de uma briga. O gosto de lágrimas chegava nas madrugadas, quando conseguia me arrastar da sala para o quarto e me jogava na cama grande, sem Ana, cujos lençóis não troquei durante muito tempo porque ainda guardavam o cheiro dela, e então me batia e gemia arranhando as paredes com as unhas, abraçava os travesseiros como se fossem o corpo dela, e chorava e chorava e chorava até dormir sonos de pedra sem sonhos. O gosto de café sem açúcar acompanhava manhãs de ressaca e tardes na agência, entre textos de publicidade e sustos a cada vez que o telefone tocava. Porque no meio dos restos dos gostos de vodca, lágrima e café, entre as pontadas na cabeça, o nojo da boca do estômago e os olhos inchados, principalmente às sextas-feiras, pouco antes de desabarem sobre mim aqueles sábados e domingos nunca mais com Ana, vinha a certeza de que, de repente, bem normal, alguém diria telefone-para-você e do outro lado da linha aquela voz conhecida diria sinto-falta-quero-voltar. Isso nunca aconteceu. O que começou a acontecer, no meio daquele ciclo do gosto de vodca, lágrima e café, foi mesmo o gosto de vômito na minha boca. Porque no meio daquele momento entre a vodca e a lágrima, em que me arrastava da sala para o quarto, acontecia às vezes de o pequeno corredor do apartamento parecer enorme como o de um transatlântico em plena tempestade. Entre a sala e o quarto, em plena tempestade, oscilando no interior do transatlântico, eu não conseguia evitar de parar à porta do banheiro, no pequeno corredor que parecia enorme. Eu me ajoelhava com cuidado no chão, me abraçava na privada de louça amarela com muito cuidado, com tanto cuidado como se abraçasse o corpo ainda presente de Ana, guardava prudente no bolso os óculos redondos de armação vermelhinha, enfiava devagar a ponta do dedo indicador cada vez mais fundo na garganta, até que quase toda a vodca, junto com uns restos de sanduíches que comera durante o dia, porque não conseguia engolir quase mais nada, naqueles dias, e o gosto dos muitos cigarros se derramassem misturados pela boca dentro do vaso de louça amarela que não era o corpo de Ana. Vomitava e vomitava de madrugada, abandonado no meio do deserto como um santo que Deus largou em plena penitência - e só sabia perguntar por que, por que, por que, meu Deus, me abandonaste? Nunca ouvi a resposta. Um pouco depois desses dias que não consigo recordar direito - nem como foram, nem quantos foram, porque deles só ficou aquele gosto de vômito, misturados, no final daquela fase, ao gosto das pizzas, que costumava perdir por telefone, principalmente nos fins-de-semana, e que amanheciam abandonadas na mesa da sala aos sábados, domingos e segundas, entre cinzeiros cheios e guardanapos onde eu não conseguia decifrar as frases que escrevera na noite anterior, e provavelmente diziam banalidades, como volta-para-mim-Ana ou eu-não-consigo-viver-sem-você, palavras meio derretidas pelas manchas do vinho, pela gordura das pizzas -, depois daqueles dias começou o tempo em que eu queria matar Ana dentro de tudo aquilo que era eu, e que incluía aquela cama, aquele quarto, aquela sala, aquela mesa, aquele apartamento, aquela vida que tinha se tornado a minha depois que Ana me deixou. Mandei para a lavanderia os lençóis verde-clarinhos que ainda guardavam o cheiro de Ana - e seria cruel demais para mim lembrar agora que cheiro era esse, aquele, bem na curva onde o pescoço se transforma em ombro, um lugar onde o cheiro de nenhuma pessoa é igual ao cheiro de outra pessoa -, mudei os móveis de lugar, comprei um Kutka e um Gregório, um forno microondas, fitas de vídeo, duas dúzias de copos de cristal, e comecei a trazer outras mulheres para casa. Mulheres que não eram Ana, mulheres que jamais poderiam ser Ana, mulheres que não tinham nem teriam nada a ver com Ana. Se Ana tinha os seios pequenos e duros, eu as escolhia pelos seios grandes e moles, se Ana tinha os cabelos quase louros, eu as trazia de cabelos pretos, se Ana tivesse a voz rouca eu a selecionava pelas vozes estridentes que gemiam coisas vulgares quando estávamos trepando, bem diversas das que Ana dizia ou não dizia, ela nunca dizia nada além de amor-amor ou meu-menino-querido, passando dos dedos da mão direita na minha nuca e os dedos da mão esquerda pelas minhas costas. Vieram Gina, a das calcinhas pretas, e Lilian, a dos olhos verdes frios, e Beth, das coxas grossas e pés gelados, e Marilene, que fumava demais e tinha um filho, e Mariko, a nissei que queria ser loura, e também Marta, Luiza, Creuza, Júlia, Débora, Vivian, Paula, Teresa, Luciana, Solange, Maristela, Adriana, Vera, Silvia, Neusa, Denise, Karina, Cristina, Marcia, Nadir, Aline e mais de 15 Marias, e uma por uma das garotas ousadas da Rua Augusta, com suas botinhas brancas e minissaia de couro, e destas moças que anunciam especialidades nos jornais. Eu acho que já vim aqui uma vez, alguma dizia, e eu falava não lembro, pode ser, esperando que tirasse a roupa enquanto eu bebia um pouco mais para depois tentar entrar nela, mas meu pau quase nunca obedecia, então eu afundava a cabeça nos seus peitos e choramingava babando sabe, depois que Ana me deixou eu nunca mais, e mesmo quando meu pau finalmente endurecia, depois que eu conseguia gozar seco ardido dentro dela, me enxugar com alguma toalha e expulsá-la com um cheque cinco estrelas, sem cruzar então eu me jogava de bruços na cama e pedia perdão à Ana por traí-la assim, com aquelas vagabundas. Trair Ana, que me abandonara, doía mais que ela ter me abandonado, sem se importar que eu naufragasse toda noite no enorme corredor de transatlântico daquele apartamento em plena tempestade, sem salva-vidas. Depois que Ana me deixou, muitos meses depois, veio o ciclo das anunciações, do I Ching, dos búzios, cartas de Tarot, pêndulos, vidências, números e axés - ela volta, garantiam, mas ela não voltava - e veio então o ciclo das terapias de grupo, dos psicodramas, dos sonhos junguianos, workshops transacionais, e veio ainda o ciclo da humildade, com promessas à Santo Antônio, velas de sete dias, novenas de Santa Rita, donativos para as pobres criancinhas e velhinhos desamparados, e veio depois o ciclo do novo corte de cabelos, da outra armação para os óculos, guarda-roupa mais jovem, Zoomp, Mister Wonderful, musculação, alongamento, yoga, natação, tai-chi, halteres, cooper, e fui ficando tão bonito e renovado e superado e liberado e esquecido dos tempos em que Ana ainda não tinha me deixado que permiti, então, que viesse também o ciclo dos fins de semana em Búzios, Guarajá ou Monte Verde e de repente quem sabe Carla, mulher de Vicente, tão compreensiva e madura, inesperadamente, Mariana, irmã de Vicente, transponível e natural em seu fio dental metálico, por que não, afinal, o próprio Vicente, tão solícito na maneira como colocava pedras de gelo no meu escocês ou batia outra generosa carreira sobre a pedra de ágata, encostando levemente sua musculosa coxa queimada de sol e o windsurf na minha musculosa coxa também queimada de sol e windsurf. Passou-se tanto tempo depois que Ana me deixou, e eu sobrevivi, que o mundo foi se tornando ao poucos um enorme leque escancarado de mil possibilidades além de Ana. Ah esse mundo de agora, assim tão cheio de mulheres e homens lindos e sedutores interessantes e interessados em mim, que aprendi o jeito de também ser lindo, depois de todos os exercícios para esquecer Ana, e também posso ser sedutor com aquele charme todo especial de homem-quase-maduro-que-já-foi-marcado-por-um-grande-amor-perdido, embora tenha a delicadeza de jamais tocar no assunto. Porque nunca contei à ninguém de Ana. Nunca ninguém soube de Ana em minha vida. Nunca dividi Ana com ninguém. Nunca ninguém jamais soube de tudo isso ou aquilo que aconteceu quando e depois que Ana me deixou. Por todas essas coisas, talvez, é que nestas noites de hoje, tanto tempo depois, quando chego do trabalho por volta das oito horas da noite e, no horário de verão, pela janela da sala do apartamento ainda é possível ver restos de dourados e vermelhos por trás dos edifícios de Pinheiros, enquanto recolho os inúmeros recados, convites e propostas da secretária eletrônica, sempre tenho a estranha sensação, embora tudo tenha mudado e eu esteja muito bem agora, de que este dia ainda continua o mesmo, como um relógio enguiçado preso no mesmo momento - aquele. Como se quando Ana me deixou não houvesse depois, e eu permanecesse até hoje aqui parado no meio da sala do apartamento que era o nosso, com o último bilhete dela nas mãos. A gravata levemente afrouxada no pescoço, fazia e faz tanto calor que sinto o suor escorrer pelo corpo todo, descer pelo peito, pelos braços, até chegar aos pulsos e escorregar pela palma das mãos que seguram o último bilhete de Ana, dissolvendo a tinta das letras com que ela compôs palavras que se apagam aos poucos, lavadas pelo suor, mas que não consigo esquecer, por mais que o tempo passe e eu, de qualquer jeito e sem Ana, vá em frente. Palavras que dizem coisas duras, secas, simples, arrevogáveis. Que Ana me deixou, que não vai voltar nunca, que é inútil tentar encontrá-la, e finalmente, por mais que eu me debata, que isso é para sempre. Para sempre então, agora, me sinto uma bolha opaca de sabão, suspensa ali no centro da sala do apartamento, à espera de que entre um vento súbito pela janela aberta para levá-la dali, essa bolha estúpida, ou que alguém espete nela um alfinete, para que de repente estoure nesse ar azulado que mais parece o interior de um aquário, e desapareça sem deixar marcas.

[Caio Fernando Abreu]