sábado, 30 de setembro de 2017

Do recesso do amor

"Porque as distâncias eram grandes, escreviam-se cartas. Porque era preciso esperar as cartas, havia tempo. Porque havia tempo, falava-se de amor. Porque falava-se de amor, escreviam-se mais cartas.
E porque era preciso fazer as cartas chegarem mais rápido, construíam-se estradas. Estradas que nos levaram mais rápido ao futuro: encurtaram-se as distâncias.
 E porque encurtaram-se as distâncias, aumentou o trabalho. E porque o trabalho aumentou, escasseou o tempo. E pela escassez de tempo, cessaram as cartas. E pela falta das cartas, recesso para o amor.
Porque o amor entrou em recesso, o avanço. E porque veio o avanço, criou-se a tal rede. E porque a rede se criou, encurtaram-se as distâncias. Até mesmo entre os amores. Até mesmo entre os tempos.
E no mundo contido dentro da rede, nasceram de novo as cartas. Agora instantâneas. Que, como aviõezinhos de papel, eram lançadas incessantemente de uma ponta a outra do mapa. Palavras, dores, saudades e sons percorriam num susto longas distâncias, para chegar aos ouvidos da outra ponta do mapa.
O mundo virou teia de cartas. Um emaranhado de dores e amores e gentes se vendo e ouvindo e dizendo em todas as línguas. Um mundo abraçando o mundo carente de cartas, caminhos, estradas e de andar a pé pra relembrar.
Virtuais, as cartas tornaram amores reais.
E a cada nova carta, um mundo de amor. A teia. E a cada novo mundo, mais cartas. E já não era possível desfazer os nós. E as pessoas deram-se as mãos, como antes não acontecia. E eram semelhantes as mãos que se davam, sem que a distância fosse empecilho. E era de mãos também a grande teia.
Mas, como o virtual brilhasse, o real perdeu sua força. Não mais se olharam as pessoas. O amor em recesso mais uma vez.
E como o recesso faz buracos, mais gente da ponta do mapa procurou gente da outra ponta. E do meio. E de um pedacinho ao sul ou ao norte. E as latitudes as mais diversas passaram a se olhar, como não mais os olhos se olhavam. E como as palavras de longe chegavam ao pé do ouvido, falou-se de perto. E porque de longe acendiam-se almas, encurtaram-se as distâncias.
Mas, um dia, de tanto viajarem as cartas, encurtando distâncias e mais distâncias, alguém olhou para o lado e descobriu a verdade.
O longe estava perto. O perto estava longe.
E assim a escassez de tempo nos aproximou da gente. A escassez do tempo nos disse verdades com sua voz rouca. E nos perguntamos se tudo isso fazia sentido. E choramos. E escrevemos novas cartas. E nos demos as mãos de verdade. E nos olhamos no olho. E redescobrimos o tempo.
E amamos. Não mais a escassez. Não mais o virtual. Não mais o longe.
E permanecem as cartas que vão e voltam. Mas o amor não entra mais em recesso."

[cris guerra]

sexta-feira, 29 de setembro de 2017

Do salto



"Então não há nada mais sensato a fazer do que soltarmos as mãos dos trapézios, perdermos a frágil segurança de nossas solidões e nos enlaçarmos em pleno ar. Talvez nos esborrachemos. Talvez saiamos voando. Não temos como saber se vai dar certo - o verdadeiro encontro só se dá ao tirarmos os pés do chão, mas a vida não tem nenhum sentido se não for para dar o salto."


[Antônio Prata]

quarta-feira, 6 de setembro de 2017

Tem dias que eu fico pensando na vida, e sinceramente não vejo saída....

"o adeus não vai deixar de doer, mesmo quando você entender que fins acontecem, que as pessoas nem sempre ficam e que a não reciprocidade não é a única infelicidade em uma paixão.
já li inúmeros textos sobre relacionamentos e conversei com vários amigos sobre suas relações. senti cada relato e aprendi com cada um deles sobre términos e recomeços, mas novamente eu falo: isso não me isenta de sentir a dor.
por mais que eu saiba que a paixão é cíclica, que se apaixonar é como pular de uma ponte e que recomeços nem sempre precisam de fins, eu ainda não sei lidar com a perda.
com a ausência.com a expectativa frustrada.com a entrega desenfreada colidindo sempre com a dor.e dói.o caos se instala.acabo perdendo o ritmo das coisas.prefiro ficar só.eu paro.

escrevo como quem busca no sentir a sua salvação. 

com as mãos trêmulas, eu busco ritmo nessa imensa confusão que se faz presente. eu só vou colocando tudo para fora dessa maneira desenfreada, descompassada, sem ritmo, sem sentido, mesmo sabendo que a única coisa que eu faço nesse momento é sentir demais.
eu me entrego demais.
e quando tudo acaba, eu ardo.
eu sofro.
eu choro.
e eu sinto.
em algum momento, eu acreditei que amadurecer emocionalmente era sinônimo de não sofrer mais, onde na verdade é saber o que fazer com a dor.
então agora, eu a sinto.
mas amanhã eu espero que ela vá.
assim como você se foi."

terça-feira, 5 de setembro de 2017

Do fio

"Você é um amor que não aconteceu, e desses, eu tenho um monte. Poucos são os que acontecem, mas é impressionante como são esses, os que ficam por um fio de acontecer, que nos desequilibram. A gente fica com aquela sensação que seria perfeito, aquele gosto de não ter acordado juntos o suficiente e que faltaram viagens e histórias a serem vividas. E eu me apego a essas histórias que só tem começo e fim, deixando o meio ser fantasiado, imaginando que seria ótimo, aquilo que nós não permitimos ser coisa alguma."

[Bruno Fontes]