segunda-feira, 17 de novembro de 2008
Das pedrinhas
"De vez em quando a alegria
atira pedrinhas em minha janela.
Quer avisar-me que está lá esperando.
Mas hoje me sinto calmo
quase, diria, equânime.
Vou guardar a angústia em seu esconderijo
e deitar-me de cara ao teto,
que é uma posição galharda e cômoda
para filtrar notícias e acreditar nelas.
Quem sabe onde estarão minhas próximas pegadas,
ou quando minha história vai ser contada?
Quem sabe que conselhos ainda vou inventar,
e que atalho acharei para não segui-los?
Está certo, não brincarei de despejo,
não disfarçarei a recordação com esquecimentos.
Muito fica por dizer e calar,
e também ficam uvas para encher a boca.
Está bem, me dou por convencido.
Que a alegria não atire mais pedrinhas.
Abrirei a janela.
Abrirei a janela."
[Mário Benedetti]
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