quinta-feira, 7 de abril de 2016

Do ceu

“Olha pra cima, porque é lá que estão as melhores coisas”. 

Soltou a frase assim, no meio da rua, da boca pra fora, num supetão de pensamento que ela mesma se surpreendeu. Ele riu, sem entender muito bem o que aquilo significava. 
Levantou a cabeça, avistou o céu. 
Azul, nuvens brancas, como havia de ser. 

Nuvens. Pragmaticamente são só nuvens. 
Essa densidade formada pela condensação de partículas de água. 
Cobriu os olhos dele e sorriu. “Lá em cima tem felicidade”. 
É lá no alto que estão as verdades, o elevado, a existência de si. 
E o amor. 
Mas depois que viramos adultos, nos acostumamos a sempre olhar pra baixo. 

O concreto, o palpável, aquilo que cabe dentro das coisas classificáveis. E só. 
Aqui embaixo não tem a surpresa, ou o incompreensível, ou o sentir dentro do peito a pequenez das gentes diante do firmamento. 
Já o céu é igual em todos os lugares. 
Tudo um só, unindo de alguma forma o que somos. 
Bichos. Ser, humano. 

Ser humano é ser estúpido. 
É magoar o que se ama em busca de sensações. De liberdade. 
Uma falsa liberdade, porque sem consciência de si, não se é livre. 
E daí vem o sofrimento. A dor. 
O que se faz é o que se é, o que se tem é o que se é. 
E ponto final. 

Mas ela não, ela criava seu próprio céu. Dentro. 
E acreditava que todos teriam a mesma coragem de perceber o outro. E chorava. 
De um choro tão verdadeiro que causava piedade em qualquer um que passasse por sua janela aberta. Menos nele. 
Ele, esporadicamente sem culpa pela sua solidão. A dela. 

Aceite seu isolamento, mas não concorde. 
Abaixe a cabeça como um cavalo amordaçado e fique aí, quietinha, esperando seu dono chegar. 
Mal sabe ele que quem mais sofre é aquele que machuca. 
O céu dos dois, agora, completamente diferente.

Ana Paula Magalhães


Nenhum comentário: